terça-feira, março 31, 2015

A Barra de Aveiro em Mira


Em 1802 a barra de Aveiro era em Mira.


sexta-feira, março 27, 2015

Que lindo ranchinho

Com a devida vénia, artigo de Manuel Farias https://www.facebook.com/manuel.farias.904?fref=nf

O meu artigo mensal no Jornal FOLCLORE. Ajudem-me a salvar a cultura tradicional do povo português, não fazendo confusão entre "ranchos" e folclore. São coisas tão diferentes que chegam a ser opostas.
"TRAJAR À RANCHO
Em Portugal existem duas histórias de ranchos; uma é real e enraizada, outra é mítica e presumida. A primeira diz-nos que o “rancho” é uma expressão do mundo rural português, aplicada quando se juntavam grupos de pessoas para se deslocaram a pé a locais onde havia trabalho, sabendo que iriam ser alimentados com uma iguaria simples, pobre e autossuficiente a que também se chamava “rancho”, ou para cumprir obrigações religiosas em locais de romaria, aproveitando para folgar e matar a sua imensa fome de diversão… esta história de ranchos é comum a todos os países da Europa, embora tenha ocorrido em épocas diferentes, de acordo com a instalação da revolução industrial e do seu impacto económico, social e cultural.
A segunda história de ranchos é contemporânea e exclusiva de Portugal; observada à distância, apresenta-se surreal, breve e manipulada, ao contrário da primeira que foi factual, espontânea e continuada por muitas gerações. Estes “ranchos” dizem respeito a grupos de pessoas, reunidos por encomenda e com a finalidade de dançar de modo alinhado e certinho, em cima de um palco ou noutro local, com a única obrigação de divertir os assistentes. Esta história começa na década de vinte do século passado e explodiu nas décadas seguintes por necessidade e incentivo do regime fascista do Estado Novo. Por este motivo, esta segunda história de ranchos não existe em nenhum outro país da Europa, salvo os que foram criados pela diáspora portuguesa.
Nas primeiras décadas do século XX, no mundo rural português, o povo vivia com os mesmos padrões comportamentais e dependia dos mesmos saberes tradicionais que as gerações anteriores cultivaram e aperfeiçoaram. Nomeadamente, no que respeita ao trajar com simplicidade, pobreza e autossuficiência; todavia, os ranchos organizados para subir ao palco e fazer a recepção a governantes republicanos e outras individualidades que se deslocavam à província, foram vestidos com indumentárias novas e exuberantes, bem mais garridas e enfeitadas do que as que as mesmas pessoas usavam no seu cotidiano. Ou seja, foram vestidas à rancho.
Logo depois, os arquitectos do Estado Novo ainda foram mais longe e desenharam fardamentos para os ranchos, chamando-lhes trajos regionais; nessa onda, as mulheres do Minho (simples, pobres e autossuficientes) foram apresentadas com o traje à vianesa (composto, rico e encomendado) e por aí abaixo, até ao Algarve, o SPN – Secretariado de Propaganda Nacional escreveu uma história nova para o povo português, vestido à rancho, na tentativa de matar o trajar simples, pobre e autossuficiente… mas fortíssimo pela simplicidade, peculiar na auto-suficiência e com aspectos de identidade únicos derivados da criatividade que a pobreza incita. Este trajar autêntico foi afastado dos ranchos, mas mais tarde foi retomado pelos grupos de folclore.
O século XX terminou com os ranchos novos a recolher o trajar nos ranchos antigos, a chamar de modo impróprio e abusivo “folclore” a toda esta criação e pronto… chegámos ao século XXI.
Hoje, onde poderá ser revisitado o folclore de Portugal, no que respeita ao trajar simples, pobre e autossuficiente, que agasalhou e enfeitou as mulheres e os homens de Portugal, bem como as suas crianças, antes de aparecerem os ranchos? Certamente nos grupos de folclore que não adoptam o conceito de rancho e se sentem insultados quando são tratados desse modo.
Os grupos de folclore, em Portugal são confrontados com dificuldades acrescidas, que os seus congéneres de Espanha, França, Itália, Alemanha, Holanda e todos os demais países europeus não sofrem; para além da simples dificuldade de existir e produzir resultados, os grupos de folclore portugueses debatem-se com a dificuldade de investigar por detrás de uma história virtual, densa e espampanante, tantas vezes repetida que muitos já a tomam por verdadeira e que substituiu a história real do trajar simples, pobre e autossuficiente dos portugueses, que ainda ocorria de modo generalizado e espontâneo há apenas três ou quatro gerações.
Quem se quiser vestir à rancho pode fazê-lo, cantando um hino à liberdade de expressão e à tolerância que devemos cultivar como expoente de cidadania, porque afinal o carnaval também pode ser quando um homem quiser. No que respeita ao meu respeito pela história e pelos factos, prefiro que me digam “…oh pá!... diz lá o que queres!... és um dançarino! Deixa-te de folclores!”, do que o que ouvi recentemente: “Bi-te há dias… tabas bustido à raintcho”.

quarta-feira, março 25, 2015

Sem ofender o burro


O analfabeto mediático é tão burro que se orgulha e estufa o peito para dizer que viu/ouviu a informação no Jornal Nacional e leu na Veja, por exemplo. Ele não entende como é produzida cada notícia: como se escolhem as pautas e as fontes, sabendo antecipadamente como cada uma delas vai se pronunciar. Não desconfia que, em muitas tevês, revistas e jornais, a notícia já sai quase pronta da redacção, bastando ouvir as pessoas que vão confirmar o que o jornalista, o editor e, principalmente, o “dono da voz” (obrigado, Chico Buarque!) quer como a verdade dos fatos. Para isso as notícias se apoiam, às vezes, em fotos e imagens. Dizem que “uma foto vale mais que mil palavras”. Não é tão simples (Millôr, ironicamente, contra-argumentou: “então diga isto com uma imagem”). Fotos e imagens também são construções, a partir de um determinado olhar. Também as imagens podem ser manipuladas e editadas “ao gosto do freguês”. Há uma infinidade de exemplos. Usaram-se imagens para provar que o Iraque possuía depósitos de armas químicas que nunca foram encontrados. A irresponsabilidade e a falta de independência da média norte-americana ajudaram a convencer a opinião pública, e mais uma guerra com milhares de inocentes mortos foi deflagrada.

(Reflexões do jornalista Celso Vicenzi em torno de poema de Brecht, no século 21)

quinta-feira, março 19, 2015

A lista, por favor.

EU DEFENDO A LISTA VIP DO FISCO
(António José Teixeira, Expresso Diário, 19/03/2015)

Há um enigma que envolve a paixão dos humanos por listas. Listas imperdíveis de favoritos de tudo, de livros, filmes, dos melhores, dos piores. Gostamos de listas. De ordenar, selecionar, catalogar, incluir, excluir. Estar, ou não estar, na lista, faz toda a diferença. Fica-se dentro, por dentro, ou à margem, de fora. Há listas no fisco? «Lista de contribuintes VIP»? «Bolsa VIP»? Ou «pacote VIP»? Foi a pergunta das últimas semanas. A dúvida pairou ao ritmo das mais convictas negações. É da natureza humana, nem precisamos de recorrer à semiótica, a desconfiança nas grandes juras. A repetição de nãos, nunca e jamais, gera mais dúvidas do que certezas. E quando algumas centenas de almas, investidas como inspetores tributários estagiários, escutam um chefe do fisco falar de «bolsa VIP» ou «pacote VIP» vale de pouco negar a evidência. A intenção parece igualmente óbvia. Trata-se de proteger nomes importantes da devassa. Não é uma lista VIP para escrutínio fiscal mais apurado. Poderia ser. Mas uma lista de individualidades com campainhas nos cortinados, que denunciam os voyeurs que lhe querem deitar os olhos.

Há lista, há indignação, escândalo e caso. Afinal, havia lista. Mentira, demissão, responsabilidade política, desconfiamos de tudo e de todos. De pouco valem as proclamações mais democráticas: todos somos iguais perante o fisco, não podem existir privilégios só para alguns. O nascimento do Estado moderno ficou precisamente marcado pelo princípio da igualdade perante os encargos. Uma lista de proteção não significa necessariamente contas menos certas, evasão ou fraude fiscais, mas o alarme de proteção só para alguns lança suspeições compreensíveis. A ideia de casta protegida é incompatível com o estado democrático.
Os principais titulares de cargos públicos merecem figurar numa lista fiscal VIP, não para se protegerem, mas para tornarem públicos os seus rendimentos e o cumprimento das suas obrigações fiscais
Segundo a Visão, Vítor Lourenço, chefe de divisão dos serviços de auditoria do fisco, contou de viva voz perante uma grande plateia reunida na Torre do Tombo, que há «promiscuidade de passwords» entre os funcionários, que há «conflitos de interesses» envolvendo negócios paralelos, que funcionários reformados, agora a trabalhar no setor privado, têm acesso aos ficheiros dos contribuintes... Doravante, é precisa muita fé para confiar nos fiéis do armazém da coleta fiscal. Lourenço revela ainda que estão monitorizados os «acessos indevidos» ao «pacote VIP». Os muito importantes deste país, mesmo sabendo-se pouco da sua identidade e extensão, poderão ficar descansados. Os ditos «contribuintes em geral» é que não. Isso mesmo reconhece o chefe de divisão.
Para o fisco, cada cidadão devia ser um número. Direitos e deveres semelhantes de acordo com as obrigações definidas por lei. A haver alguma desigualdade, a haver uma lista VIP entre os contribuintes, devia funcionar ao contrário do que se fez. Os principais titulares de cargos públicos merecem figurar numa lista fiscal VIP, não para se protegerem, mas para tornarem públicos os seus rendimentos e o cumprimento das suas obrigações fiscais. Esta deveria ser a verdadeira lista VIP do fisco. Não a que se quer esconder, mas a que se deveria mostrar. Desde logo para matar a curiosidade. Mas também pela clareza e pelo exemplo. A transparência não é um valor absoluto democrático. Pode até ser um valor totalitário. Mas neste caso, deve ser uma obrigação de rigor. E em boa parte já se cumpre perante o Tribunal Constitucional.
A lista VIP respondeu à curiosidade sobre a carreira contributiva do primeiro-ministro. Almas diligentes quiseram pôr travões à devassa. Não foi necessariamente por boas razões. Mesmo que possam parecer piedosas. Lista VIP sim, mas para prestar contas. Não para as esconder.

terça-feira, março 17, 2015

O analfabeto político



O analfabeto político

O pior analfabeto, é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
O preço do feijão, do peixe, da farinha
Do aluguel, do sapato e do remédio
Depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que
Se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política.
Não sabe o imbecil,
Que da sua ignorância nasce a prostituta,
O menor abandonado,
O assaltante e o pior de todos os bandidos
Que é o político vigarista,
Pelintra, o corrupto e o espoliador
Das empresas nacionais e multinacionais.

Bertold Brecht

Vê lá se és capaz, mas sem te rires!


Vê lá se és capaz, mas sem te rires!
https://rcag1991.wordpress.com/2015/03/17/o-fmi-diz-sem-se-rir-que-o-ajustamento-falhou/

segunda-feira, março 16, 2015

A caminho do baile

Luis Ricardo Falero
(Granada, 1851 - Londra, 1896)
"Witches going to their Sabbath", 1878
olio su tela, 145.5 × 118.2 cm.
Collezione privata

O Diabo rola pedras pelas Marranhuças abaixo até à Lagoa do Frade onde a dança das bruxas se prepara para a noite de amanhã. Amanhã será o dia delas. Hoje, o Chifrudo rola as pedras de enxofre, muda o inferno de sítio pondo todos os diabos, diabinhos e almas penadas em polvorosa.

sexta-feira, março 13, 2015

Tu já eras o presidente, acredita!

- Por mim, tu já eras o presidente, acredita! Não é que eu esteja a virar a casaca, nem penses em tal que eu sempre fui da causa, conforme tu bem sabes. Eu não espero nem peço um qualquer favorezeco dele nem que seja coisa pouca, apesar de não estarmos ainda perto para ganhar, mas tu tens grandes chances. Tu não tens nada que te apontem, enquanto ele tem muitos rabos trilhados, muitas borradas, coisas feias e erradas que ele tem feito para aí. Eu sei que há pessoas que vão a correr a oferecer os seus préstimos ao presidente, alguns para as listas, eles ou um dos filhos, para suplentes, dizem, em troca de umas coisitas sem importância. Sabes que essas pessoas pensam que será sempre melhor ser a favor que contra, mesmo que isso não seja a garantia de convite para o porco assado no espeto. Como sabes, eles são uns invejosos e traiçoeiros, mas eu não sou desses! Eu e a minha família votaremos em ti, e só que não posso fazer parte da tua lista porque depois o presidente nem me irá falar.

quarta-feira, março 11, 2015

O fenómeno e a sua observação


O fenómeno e a sua observação
Há 40 anos a Figueira da Foz era uma cidade com um nevoeiro matinal muito semelhante ao de hoje, mas tinha um outro cheiro garantidamente, e outros ruídos no meio dele. Não circulavam muitos automóveis e os autocarros do Farreca cheiravam a peixe nos aventais das peixeiras de Buarcos ao chegarem ao Mercado Municipal, ali ao lado do Jardim. A cidade dominada pela torre do Grande Hotel, ainda ouviria, mas por pouco tempo mais, os ruídos dos carros de cavalo dos distribuidores da mercadoria chegada à estação do Caminho-de-ferro, via linha do Oeste e Ramal de Alfarelos. Os cavalos estavam a deixar de ser rentáveis e o som dos seus cascos estava perto de deixar de ser ouvido nas ruas da cidade Rainha da Praias de Portugal. Com os sons dos cascos dos muares do carreto iriam os Festivais da Canção e de Cinema, perdendo a cidade e a praia a Claridade, e o Grande Hotel o tamanho. O comboio seguiu-lhes os passos. A nova ponte tardava na sua construção e os camiões estavam cada vez mais impacientes.
Os rádios transístores portáteis, os mais avançados meios de disseminação da notícia, eram tão sofisticados que até cabiam num bolso do casaco, no bolso das calças não cabiam pois nesses nada cabia dada a moda da sua justeza junto ao corpo e larga em boca-de-sino abaixo do joelho, e só usavam, isto para os topos de gama, duas pequeníssimas pilhas de dois centímetros e meio de comprimento.
Pela primeira vez, em Portugal, a televisão fez a cobertura em directo, ao vivo e a cores preto e branco, de um acontecimento. Alguém terá comentado que tudo aquilo seria encenado, pois até a televisão lá estava.


segunda-feira, março 09, 2015

Manual do bom caloteiro

 
Manual do bom caloteiro
(Qualquer semelhança com a realidade é coincidência)
- O caloteiro nunca ofende, é sempre ofendido.
- O caloteiro coloca a honestidade acima de tudo. A dele.
- Exceção feita aos que o conhecem demasiado bem.
- O caloteiro tolera os adversários, desde que não ameacem o seu lugar.
- E o elogiem.
- O caloteiro respeita a presunção de inocência e só a despreza se necessário.
- O caloteiro não gosta de ser chamado caloteiro, acha que o retrato é injusto.
- E a justiça é muito importante para o caloteiro, ele não suporta injustiças.
- O caloteiro é sempre justo, mesmo quando reconhece não ser «exemplar».
- O caloteiro não pensa. Ele é mais um homem de ação.
- O caloteiro não tem saudades de Salazar, tem inveja.
- Acha apenas que lhe faltam os meios.
- Alguém que impedisse a divulgação dos factos contra si.
- E publicasse calúnias contra os adversários.
- Ou mesmo factos, se lhe fossem úteis.
- O caloteiro sabe que a descolonização foi muito mal feita.
- O caloteiro gostava de uma Pátria maior, a que julgava dele.
- E de mandar nela.
- O caloteiro acha que os políticos são todos corruptos.
- E por ele ia tudo preso.
- Mas diz que nem todos os políticos são iguais.
- O caloteiro não é político, ocupa o lugar que os amigos lhe impuseram. 
- O caloteiro acha que pagou todas as contas.
- Pelo menos, nunca deixou de pagar o que o Fisco o convidou a pagar.
- O caloteiro acha que as dívidas são para pagar.
- Mas pagá-las, antes de serem noticiadas, é eleitoralismo. 
- O caloteiro sempre pensou em pagar, apesar de prescrito o calote.
- E só não pagou a totalidade porque o credor negou qualquer dívida.
- O caloteiro gosta de um presidente que não se meta na luta eleitoral.
- E aprecia que repita o que dizem os outros assessores.
- O caloteiro acha que isso é isenção.
- O caloteiro sente-se injustiçado e não é como o preso.
- O caloteiro acha que a prisão preventiva é o mínimo para quem o ataca.
- O caloteiro respeita a Justiça.
- Quando é aplicada a adversários.
- O caloteiro é contra o direito à diferença.
- Mas ofende-se que não lhe reconheçam o direito à diferença.
- O caloteiro sabe que é crime enriquecer no lugar que ocupa.
- Mas não aceita a confusão com os lugares que ocupou.
- O caloteiro sofre de amnésia.
- O caloteiro não sabe onde trabalhou durante alguns anos.
- O caloteiro esqueceu-se de quem lhe pagou.
- Mas reconhece que desconhecia que tinha de pagar impostos.
- O caloteiro é pela transparência.
- Mas recusa a devassa às suas declarações de IRS.
- O caloteiro pede um subsídio de reintegração pela exclusividade de funções.
- Mas não se recorda se outras funções, em simultâneo, eram pagas.
- O caloteiro é a favor da democracia.
- Mas acha que uma democracia, com esta oposição, não é democracia.
- O caloteiro detesta que lhe chamem caloteiro.
- O caloteiro sabe que, ao negar que o é, está a ser manhoso.
- Outras vezes não sabe mesmo.
- O caloteiro odeia as Finanças e a Segurança Social.
- Mas defende que todos devem cumprir as suas obrigações.
- O caloteiro só não paga por distração e falta de dinheiro.
- O caloteiro nunca perde autoridade para exigir aos outros o que não faz.
- O caloteiro não cumpriu porque não foi convidado a fazê-lo.
- Ou foi.
- Sem carta registada.
 
(Texto adaptado de Rui Zink, sobre o «Manual do bom fascista)

Carlos Esperança

segunda-feira, março 02, 2015

A Lulu de herr Schäuble Wolfgang.


A Lulu de herr Schäuble Wolfgang.