terça-feira, agosto 06, 2013

Sua majestade, o cacique

Sua majestade, o cacique
por ADELINO MALTEZ*

Se eu começasse este meu depoimento sobre as candidaturas autárquicas, declarando que "a forma de governo" em Portugal "é uma monarquia absoluta cujo rei é sua majestade o cacique", estava apenas a parafrasear o que escreveu o aragonês Joaquín Costa, em Oligarquia y Caciquismo, de 1901. Se sublinhasse que o dito cujo "é quem todo lo manda numa determinada zona do terreno, numa freguesia, num concelho, num distrito", apenas repetia palavras de Joaquim Pedro de Oliveira Martins. Um grupo de pressão é um grupo de interesse que passa do mero estádio da articulação e da agregação de interesses, típico da mera sociedade civil, à extensão das suas canalizações no interior do sistema político. Onde não faltam as relações privadas do clientelismo, do nepotismo e da pantouflage, bem como, em casos extremos, do próprio processo de compra do poder. As eleições autárquicas, que podiam ser os vasos capilares da reg...eneração da democracia, até porque os principais partidos têm de apresentar bem mais candidatos do que a soma dos respetivos ativistas, sofrem com o enferrujamento da representação política. Podem levar a que continue em vigor a tal lei de Hermes Trismegisto, segundo a qual, aquilo que está na micropolítica traduz em calão a macropolítica, isto é, à partidocracia da cabeça da república correspondem os influentes, a nível local. Por outras palavras, há sempre oligarquias e plutocracias extralegais, correspondentes ao "coronel" no Brasil e ao boss anglo-saxónico, onde a lei de bronze da organização política faz com que "doze ou quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o Poder, perdem o Poder, reconquistam o Poder, trocam o Poder. O Poder não sai duns certos grupos, como uma péla que quatro crianças, aos quatro cantos de uma sala, atiram umas às outras, pelo ar num rumor de risos" (Eça de Queiroz, em 1867).

* Politólogo

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