Sol, o deus da Gândara.
Lembro-me bem: tão vizinhos que nós éramos todos. E sempre
saudando a manhã, e olhando-a de frente, com muita confiança e fé. Morávamos
perto uns dos outros, casas com casas, pinhais com pinhais, searas de pão com
searas de pão, no Brejo, em volta do nosso casal. O sol, ao abrir os olhos da
manhã, clareava de luz as nossas searas, e fazia-as medrar. E era o milho a
espipar, e o pão-macho, até aloirarem no tempo da colheita. O centeio não se ficava
atrás e botava a espiga, onde a gente em cachopos ia apanhar o dente-de-cão
para vendermos depois na loja do Zé Gadelheira. E amadureciam as uvas num tom
de mel: ou na cor de uva diagalves, ou da vale-de-alicante ou da moscatel. Um
deus tão muito bom e amigo das searas, o sol. Esse deus antigo, o sol que tudo
criava, parece ter-se esquecido de nós para sempre. Que já não tem o calor nem
o brilho desse tempo. O sol que tudo criava.
[Idalécio Cação]
(Texto subversivo e inédito)
1 comentário:
Hello. And Bye.
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