segunda-feira, junho 04, 2012

Um ano depois


Por Tomás Vasques, publicado em 4 Jun 2012 - 03:00


É irrelevante falar hoje nas três falsidades em que assentou a estratégia de Passos Coelho e que lhe deram a vitória eleitoral, mas nunca é de mais relembrá-las

Há um ano – cumpre-se amanhã –, o PSD ganhou as eleições legislativas antecipadas, o que lhe permitiu formar governo, em coligação com o CDS-PP. É irrelevante falar hoje nas três falsidades em que assentou a estratégia de Passos Coelho e que lhe deram a vitória eleitoral, mas nunca é de mais relembrá-las: 1) votar contra o PEC IV, fundamentando a rejeição na “extrema violência contra os portugueses” das medidas aí propostas; 2) forçar, com essa rejeição, o pedido de intervenção financeira externa, escondendo que era a única oportunidade de poder executar o programa do PSD a coberto da execução do acordo com a troika; 3) fazer uma campanha eleitoral “cor-de-rosa”, contra o despesismo do Estado e pelo bem-estar dos cidadãos, cujo paradigma foi a resposta a uma jovem estudante sobre a intenção de cortes nos subsídios de férias e de Natal - “um disparate”. É evidente que estas três falsidades assentaram que nem luva no contexto: José Sócrates estava esgotado, pessoal e politicamente, arrastando consigo o PS; o PCP, que pouco mais representa do que um adorno na lapela da nossa democracia - eleitoralmente, não aquece, nem arrefece – está sempre a sonhar, desde Novembro de 1975, com uma “grande vitória eleitoral dos comunistas”; e só a cegueira política e a ambição pessoal de Francisco Louçã, que é ao mesmo tempo, o herói e o coveiro do Bloco de Esquerda, o levaram a pensar que a derrota eleitoral do PS corresponderia à ascensão da extrema-esquerda. Tudo somado, permitiu que o PCP e o BE contribuíssem para a concretização do projecto de poder deste PSD.



Passado um ano de governo de Direita, o quadro do país é desolador e a piorar dia a dia. O que o PSD quer para Portugal conduz-nos inevitavelmente à ruína. E todos os indicadores o comprovam. As receitas do Estado diminuem consideravelmente, apesar do drástico aumento de impostos, enquanto as despesas do Estado aumentam (e já ninguém se lembra daquela “história” das poupanças nos gastos “intermédios”); os prejuízos das empresas do Estado duplicam em relação a igual período do ano passado – duplicam, sublinhe-se -, ora pela quebra de receita, ora pelo aumento dos encargos financeiros; o desemprego atinge níveis socialmente insustentáveis; os salários dos portugueses (mais de 60% dos portugueses que trabalham por conta de outrem ganha menos de 900 euros) são reduzidos significativamente; o consumo cai a pique e a economia definha, o endividamento externo cresce, enquanto o cumprimento das metas do deficit orçamental são cada vez mais uma miragem. Exactamente o contrário dos objectivos que o governo se propunha atingir. Como disse há dias a insuspeita Teodora Cardoso, presidente do Conselho de Finanças Públicas, estamos a caminho do “terceiro mundo, ou mesmo do quarto”. Não há, neste percurso, incompetência ou impreparação. A destruição da economia portuguesa e o empobrecimento dos portugueses fazem parte de um plano gizado em Berlim, pela senhora Merkel, e que, entre nós, tem em Passos Coelho um dos seus mais fiéis seguidores, cujo alinhamento com a Alemanha, na última Cimeira europeia informal, roçou um servilismo que só estávamos habituados a ver nos dirigentes do PCP, em relação à antiga União Soviética, quando lhes chamavam “o Sol da Terra”.



Podíamos ainda, crédulos e benevolentes, aceitar o empobrecimento em curso, como parte da “expiação” dos nossos “pecados”, sobretudo por termos “vivido muitos anos acima das nossas possibilidades”, como nos dizem o governo e os seus mensageiros. Mas, para que isso acontecesse, era necessário que o governo se comportasse à altura dos sacrifícios que impõe à maioria dos portugueses. O que não acontece, antes pelo contrário. O governo não diminui as despesas do Estado em serventias e mordomias e continua a viver acima das nossas possibilidades. É ver, por todos, o exemplo de António Borges, a quem o governo paga, com o dinheiro dos contribuintes, 25 mil euros por mês, para o aconselhamento sobre as privatizações. O mesmo senhor que, sem pingo de vergonha, qual abutre sobre a presa, diz que é urgente diminuir ainda mais os salários dos portugueses. Dos portugueses que já vivem na miséria, já se sabe. Em menos de um ano, percebeu-se que chegar de mota à tomada de posse ou viajar de avião em classe turística faziam parte de uma rábula bem urdida.



Jurista, escreve à segunda-feira

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