Voando sobre um ninho de cucos parte II
1. Esta semana deu vontade de gritar a
alguns políticos: "olhem que as pessoas estão a ver", "não vêem que as lesões
que estão a provocar são, elas sim, irrevogáveis". Não por eles, não para evitar
que as pessoas vejam a politiquice de baixo nível, a sua pequenez, as mentiras,
as vergonhosas contradições.
Não, por todos nós. Nunca como hoje estamos tão precisados de gente que
interprete o sentir do povo, que entenda o politicamente possível, que saiba o
significado da palavra comunidade. Nunca precisámos tanto de políticos e de
razões para neles confiarmos e nunca como nesta semana tantos políticos e com
tantas responsabilidades fizeram tanto por lhe perdermos o respeito.
Não é um Governo que está em causa, nem umas eleições. É a democracia que põem em causa com esta vergonhosa conduta.
2. O homem que apontava o caminho, o homem que tinha a solução, o homem que representava a troika, o homem que de facto liderava o País foi-se embora. Humilde, pela primeira vez, reconheceu na sua carta de demissão o que muitos há tanto tempo gritam: o plano não resulta. Correu tudo mal. Nem ele, mestre na arte da utilização do Excel, exímio malabarista do uso da meia verdade, conseguia esconder mais o absoluto fracasso. Vítor Gaspar saiu tarde e a más horas pela porta pequena, deixando um país arrasado e em muito piores condições do que aquele que encontrou.
O primeiro-ministro, claro está, ainda não percebeu nada. É até capaz de pensar que está tudo correr às mil maravilhas.
Os portugueses estão a ser vítimas do mais letal dos cocktails: gente incompetente e irresponsável a executar um programa suicida
Não é um Governo que está em causa, nem umas eleições. É a democracia que põem em causa com esta vergonhosa conduta.
2. O homem que apontava o caminho, o homem que tinha a solução, o homem que representava a troika, o homem que de facto liderava o País foi-se embora. Humilde, pela primeira vez, reconheceu na sua carta de demissão o que muitos há tanto tempo gritam: o plano não resulta. Correu tudo mal. Nem ele, mestre na arte da utilização do Excel, exímio malabarista do uso da meia verdade, conseguia esconder mais o absoluto fracasso. Vítor Gaspar saiu tarde e a más horas pela porta pequena, deixando um país arrasado e em muito piores condições do que aquele que encontrou.
O primeiro-ministro, claro está, ainda não percebeu nada. É até capaz de pensar que está tudo correr às mil maravilhas.
Os portugueses estão a ser vítimas do mais letal dos cocktails: gente incompetente e irresponsável a executar um programa suicida
A loucura pode estar definitivamente instalada e o Governo pode continuar a
fingir que está em funções mas não passará da continuação duma criminosa ilusão.
Não existirá português que leve o Governo a sério. Nada pode ser pior.
3. Se Miguel Sousa Tavares arriscou ser julgado por ter chamado palhaço a
Cavaco Silva, por maioria de razão o Presidente devia ter também denunciado
Passos Coelho e Portas ao Ministério Público. Deixar Cavaco falar sobre a
solidez do Governo lançando até um desafio aos partidos da oposição para
actuarem na Assembleia da República e fazê-lo passar pela cena circense de dar
posse a uma ministra quando o Governo já estava em pleno colapso foi um insulto
bem maior.
Digamos que o Presidente se pôs a jeito. A derrota colossal da sua estratégia
e a humilhação pública a que foi sujeito são da sua inteira responsabilidade.
Claro que Passos não se iria maçar a explicar-lhe o que quer que fosse. Claro
que Portas nem pensou em avisar Cavaco de que se ia embora. Não aguentou Cavaco
todos os disparates da governação? Não se tornou o maior aliado do Governo,
prescindindo do seu papel de árbitro do sistema? Não era claro para todos que
podia Cristo descer à Terra que Cavaco não destituiria o Governo? Quem não se dá
ao respeito acaba sempre por ser desrespeitado.
4. Mas na noite de sexta-feira Passos e Portas, depois de terem estado toda a
semana dedicados a acabar duma vez por todas com o Governo, descobrem a solução.
Vamos todos fingir que estes dois anos nunca aconteceram, que a carta de Portas
foi a brincar, que Gaspar estava só ressabiado, que se pode dar um jeitinho nas
políticas. Agora é que vai ser.
Mas será que Cavaco está tão cego ou tão aterrado que ainda vai acreditar em
quem o traiu de forma tão evidente? Será que não sabe que este Governo não passa
dum cadáver e nada nem ninguém o pode ressuscitar? Será que acredita que um
Governo liderado por Passos Coelho depois da vergonha desta semana tem condições
políticas para apresentar um Orçamento do Estado? Será que pensa que o povo
aceitará que gente que leva a palco este patético espectáculo pode cortar 4700
milhões de euros ou fazer uma reforma de Estado? Será que não percebe que é o
Governo a fonte de toda a instabilidade? Será o Presidente da República ou um
simples cidadão capaz de acreditar em Paulo Portas se ele ficar no Governo
depois de ele ter dito que a sua decisão de sair era irrevogável, que ficar
seria um acto de dissimulação, que não era politicamente sustentável ficar no
Executivo? Será que ele aceita a óbvia chantagem de que está a ser alvo pelos
partidos da coligação?
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