Alternativas à troika? As respostas
Henrique Monteiro
10:52 Quarta feira, 27 de fevereiro de 2013
...
Ontem fazia uma pergunta: se mandarmos lixar a troika, o que fazemos em seguida. Não me posso queixar de falta de respostas: ente comentários no sítio do Expresso, na página deste jornal no Facebook e na minha página do Facebook foram quase 300 - ainda que alguns comentadores tenham intervindo mais do que uma vez, como é costume.
A todos agradeço, mas nenhum me convenceu totalmente. Vamos por partes.
Uma boa parte dos comentadores optava por renegociar a dívida em termos mais favoráveis. O argumento é válido, é provavelmente prudente e assisado, mas... não é argumento. Porque, nesse caso, não mandaríamos lixar a troika. Pelo contrário, chama-la-íamos a negociações, oferecendo-lhes, pelo menos, um cafezinho. Esta é uma solução do tipo daquela que é defendida pelo PS e por setores do PSD como Manuela Ferreira Leite. É sensata.
Outra parte considerável dos comentadores optava pela saída do euro. Seria, do meu ponto de vista, um erro trágico que nos condenaria a uma miséria ainda mais miserável, se me é permitida a tautologia. Se saímos com a paridade que entrámos (um euro igual a 200 escudos, mais ou menos), rapidamente o escudo se desvalorizaria substancialmente. Na Islândia, país muitas vezes apontado como exemplo, a desvalorização da coroa foi de 80%. Imaginemos que por cá era semelhante. Isto significa que quem ganhasse mil euros passava imediatamente a ganhar 200 contos. Mas passados momentos, esses 200 contos já não valiam mil, mas apenas cerca de 560 euros. Como a maioria dos bens de consumo são importados e como as dívidas dos bancos e do Estado é em euros, podemos antever o que isso significaria. Ou seja, a brutalidade de impostos que já pagamos seria, através da inflação, multiplicada e estendida de forma cega - uma vez que a inflação é um imposto escondido que tanto pagam ricos como pobres.
Boa parte apelava ainda à aventura. Um comentador João Sá, comentava no Facebook citando o poeta José Régio - "não sei por onde vou, mas sei que não vou por aí". Outros, citaram a gesta dos Descobrimentos e outras ideias românticas. São interessantes e, por vezes, também me apetece ser assim. Mas se os versos de Régio podem ser um belo programa pessoal (o único prejudicado de uma má escolha é o próprio), não pode ser um bom programa social, em que os prejudicados são todos. Não me parece solução.
Há ainda, os que dizem - e com alguma razão - "você quer que quem já perdeu tudo, quem está desempregado, faça escolhas racionais?" (foi o caso de um comentador da página do Expresso de nickname Runaldinho). Mas, meu caro, não são esses que intervêm na praça pública. Quem está a intervir na praça pública, a cantar o Grândola não são, sobretudo, os desesperados. Entre os que estiveram no Parlamento conheci alguns. Um deles foi meu professor na universidade. O meu apelo à racionalidade é para aqueles que, como o senhor ou eu, ainda têm o suficiente para não desesperar e para perceber que da democracia se passa facilmente à demagogia e desta à ditadura que beneficia alguns, mas se torna ainda pior para todos.
O povo é quem mais ordena é uma frase que, pessoalmente, cantei muitas vezes. Tem sentido democrático e não há melhor método do que as eleições para decidir quem Governa. Mas, mesmo com eleições, não há a garantia de boas escolhas. Hitler ganhou na Alemanha. Berlusconi é um caso; Beppe Grillo outro.
As eleições italianas, como as gregas antes, demonstram o que acontece quando se deixa a demagogia à solta. Quando os sentimentos substituem a razão. Não me sentiria bem se contribuísse, um pouco que fosse, para isso.
Twitter: @HenriquMonteiro https://twitter.com/HenriquMonteiro
Facebook:Henrique Monteiro http://www.facebook.com/hmonteir
Henrique Monteiro
10:52 Quarta feira, 27 de fevereiro de 2013
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Ontem fazia uma pergunta: se mandarmos lixar a troika, o que fazemos em seguida. Não me posso queixar de falta de respostas: ente comentários no sítio do Expresso, na página deste jornal no Facebook e na minha página do Facebook foram quase 300 - ainda que alguns comentadores tenham intervindo mais do que uma vez, como é costume.
A todos agradeço, mas nenhum me convenceu totalmente. Vamos por partes.
Uma boa parte dos comentadores optava por renegociar a dívida em termos mais favoráveis. O argumento é válido, é provavelmente prudente e assisado, mas... não é argumento. Porque, nesse caso, não mandaríamos lixar a troika. Pelo contrário, chama-la-íamos a negociações, oferecendo-lhes, pelo menos, um cafezinho. Esta é uma solução do tipo daquela que é defendida pelo PS e por setores do PSD como Manuela Ferreira Leite. É sensata.
Outra parte considerável dos comentadores optava pela saída do euro. Seria, do meu ponto de vista, um erro trágico que nos condenaria a uma miséria ainda mais miserável, se me é permitida a tautologia. Se saímos com a paridade que entrámos (um euro igual a 200 escudos, mais ou menos), rapidamente o escudo se desvalorizaria substancialmente. Na Islândia, país muitas vezes apontado como exemplo, a desvalorização da coroa foi de 80%. Imaginemos que por cá era semelhante. Isto significa que quem ganhasse mil euros passava imediatamente a ganhar 200 contos. Mas passados momentos, esses 200 contos já não valiam mil, mas apenas cerca de 560 euros. Como a maioria dos bens de consumo são importados e como as dívidas dos bancos e do Estado é em euros, podemos antever o que isso significaria. Ou seja, a brutalidade de impostos que já pagamos seria, através da inflação, multiplicada e estendida de forma cega - uma vez que a inflação é um imposto escondido que tanto pagam ricos como pobres.
Boa parte apelava ainda à aventura. Um comentador João Sá, comentava no Facebook citando o poeta José Régio - "não sei por onde vou, mas sei que não vou por aí". Outros, citaram a gesta dos Descobrimentos e outras ideias românticas. São interessantes e, por vezes, também me apetece ser assim. Mas se os versos de Régio podem ser um belo programa pessoal (o único prejudicado de uma má escolha é o próprio), não pode ser um bom programa social, em que os prejudicados são todos. Não me parece solução.
Há ainda, os que dizem - e com alguma razão - "você quer que quem já perdeu tudo, quem está desempregado, faça escolhas racionais?" (foi o caso de um comentador da página do Expresso de nickname Runaldinho). Mas, meu caro, não são esses que intervêm na praça pública. Quem está a intervir na praça pública, a cantar o Grândola não são, sobretudo, os desesperados. Entre os que estiveram no Parlamento conheci alguns. Um deles foi meu professor na universidade. O meu apelo à racionalidade é para aqueles que, como o senhor ou eu, ainda têm o suficiente para não desesperar e para perceber que da democracia se passa facilmente à demagogia e desta à ditadura que beneficia alguns, mas se torna ainda pior para todos.
O povo é quem mais ordena é uma frase que, pessoalmente, cantei muitas vezes. Tem sentido democrático e não há melhor método do que as eleições para decidir quem Governa. Mas, mesmo com eleições, não há a garantia de boas escolhas. Hitler ganhou na Alemanha. Berlusconi é um caso; Beppe Grillo outro.
As eleições italianas, como as gregas antes, demonstram o que acontece quando se deixa a demagogia à solta. Quando os sentimentos substituem a razão. Não me sentiria bem se contribuísse, um pouco que fosse, para isso.
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